Semana passada eu tive a oportunidade de ler este livro muito interessante organizado pelo escritor Roberto de Sousa Causo e publicado pela Editora Terracota.
Contos Imediatos apresenta 12 contos, quase todos bons (um ou outro muito bom) e um ensaio sobre ficção científica (nem tão bom assim).
A impressão que eu tive do livro é que o organizador tentou reunir 12 contos para “apresentar” a FC a um público mais diversificado. Há coisas para todos os gostos: contos passados no espaço, em futuro próximo, em futuro distante, distopias, aventura, relacionamentos amorosos.
Eu li algumas críticas aos Contos Imediatos que realmente não fazem muito sentido pra mim. Não posso chegar ao extremo de dizer que este livro apresenta o melhor da FC nacional. Mas tem contos bons, autores experientes e no geral acho que o livro vale a pena.
A contra-capa do livro apresenta um texto muito interessante sobre um assunto que eu já discuti aqui. Reproduzo abaixo, parte do texto (espero que ninguém me processe…hehe):
Você vive em um mundo interconectado. Onde quer que você esteja, está a um segundo de qualquer lugar. Usa seu celular para conquistar galáxias. Na cozinha, descongela frangos transgênicos com raios que movimentam moléculas de água. É acompanhado a cada segundo por satélites movendo-se em órbita… A ficção científica invadiu o mundo real. Você não pode mais fugir dela…
Então, a coletânea Contos Imediatos se propõe a isso. Mostrar ao leitor que muito daquilo que vivemos é FC transformada em realidade. E o livro não para por aí, já que apresenta algumas situações que estão próximas de nós, mesmo que não sejam tão reais assim.
Vejam o que eu achei dos contos:
Um Estranho no Paraíso (Jorge Luiz Calife): Uma história de amor passada num futuro bem distante protagonizada por Angela Duncan, que me parece ser a personagem preferida de Calife. Salvo algum engano da minha parte, o conto é passado depois da trilogia Padrões de Contato. Angela está numa nave rumo a um aglomerado de estrelas fora do plano galáctico. O conto tem um “quê” de sustentabilidade e busca por um mundo perfeito. Calife mostra mais uma vez um bom conhecimento científico ao descrever a nave e o ambiente em que Angela vive. Gostei.
Déjà-Vu (Luis Bras): Luis Bras conta uma história de FC bem básica. Um ataque militar a uma base inimiga para recuperar um artefato estratégico importante: um portal do tempo. O que mais chama a atenção é a narrativa de Luis Bras. O conto é dividido em pequenos capítulos que podem ser lidos de dois modos diferentes: do primeiro ao último ou do último ao primeiro. Não é a primeira vez que eu vejo isso, mas convenhamos que é uma maneira legal de contar uma história. Muito bom.
Netúnia e Libra Quatro (Ataíde Tartari): A humanidade está colonizando o Sistema Solar. Algumas colônias são instaladas depois do Cinturão de Kuiper a fim de explorar o gelo (e portanto a água) presentes nessa região. O problema é que essas colônias distantes tem um contato limitado com o centro do Sistema e seus mundos mais populosos. Um jovem vê a oportunidade de mudar de vida quando o mundo em que vive se aproxima do periélio (maior aproximação do sol), um evento que ocorre a cada 200 anos. Conto despretensioso mas agradável de ser lido.
Cibermetarrealidade (Tibor Moricz): Tem um pouco de cyberpunk nesse conto. Um mundo todo habitado por robôs, nanotecnologia, uma sociedade controlada e burocrática. O protagonista é só “mais um”, mas busca sua identidade, busca seu propósito. O autor faz uma certa crítica à sociedade em que vivemos, à metrópole que constrói e destrói ao mesmo tempo. Interessante.
Rejeição (Chico Pascoal): Num futuro distante, um cientista tenta encontrar provas para limpar o nome de seu pai, o comandante de uma nave espacial que foi acusado de causar a morte de toda a sua tripulação. Não é um conto brilhante, mas acaba prendendo a atenção.
O Olho que Tudo Vê (Ademir Pascale): Talvez esse conto seja mais de suspense que de FC. Um homem recebe o implante de um olho artificial que lhe permite enxergar o futuro e o passado. Não é de todo original, mas é interessante.
Camarões do Espaço (Miguel Carqueija): Muito interessante esse conto. “Pescadores” espaciais vão atrás de entidades desconhecidas (os tais camarões) que parecem ser criaturas formadas exclusivamente de plasma. O grande problema no conto é que a ciência por trás da história não é muito convincente e isso incomoda um pouco. Se alguns números ou descrições fossem consertados, acho que o conto seria muito bom. Achei bom…:)
Acesso Negado (Tatiana Alves): Uma distopia que mostra o que acontece com quem vai contra o sistema. Mostra um mundo daqueles “chatos”, onde tudo se repete, tudo é sempre igualzinho. Gostei da maneira como a autora conduziu essa história, apesar de ser um tema um tanto batido. O finalzinho do conto é muito bom.
Singularis Veritas (Mustafá Ali Kanso): Um arqueólogo é ridicularizado por sustentar um mito antigo sobre uma cidade que foi coberta pelo mar. A ideia é mostrar ao leitor que não existe verdade absoluta e que os cientistas devem estar abertos a novas propostas. Isso tem tudo a ver com o mundo em que vivemos, onde a ficção se torna realidade dia após dia. Interessante, mas o final fica meio óbvio no meio do conto.
Pindorama (Sidemar V. de Castro): Gostei desse conto, uma ótima mistura de FC com mitologia indígena. O autor apresenta uma origem alienígena para a vida na Terra e tenta encaixá-la em lendas dos índios brasileiros. Leitura muito agradável e surpreendente. Muito bom.
Noite (João Batista Melo): O Sol atingiu um estágio evolutivo no qual não permite mais vida na Terra. Um homem deseja voltar ao planeta para rever o pôr-do-sol, uma imagem que nunca conseguiu esquecer desde que foi forçado a abandonar o planeta quando criança. Poesia 10 x Ciência 0. em outras palavras: o conto é bonito mas inconsistente cientificamente.
Pensamento (Andre Carneiro): A coletânea termina com um ótimo conto que mostra um triângulo amoroso inconsciente e surpreendente. O tema central é a clonagem, e um dos “personagens” é um cérebro criado artificialmente. Comunicando-se através de “ondas cerebrais” o clone acaba interferindo na vida de um casal de cientistas. No mínimo perturbador.
O que mais chama a atenção em Contos Imediatos é a quantidade de temas apresentados. Se o organizador da coletânea queria mostrar a FC a um público não habituado a esse tipo de publicação, acho que conseguiu. Aí está um bom presente para você dar a um amigo que não conhece FC…:)
Oi, Daniel. Grato pelo seu interesse em resenhar o livro. Grande abraço.
Daniel
Sempre estive mais para Bradbury que para Asimov. Daí, fiquei contente (de verdade) com seu comentário sobre meu conto.
Abraços.
Olá Joao, eu realmente gostei muito do tom melancólico do conto. Nesse ponto, talvez seja um dosmais marcantes do livro.